Por quê? (380) – Frustração


Cláudio Amaral

Estou frustrado, caro e-leitor.

Afinal, o sistema Pró-Sangue me impediu de praticar uma das atividades mais prazerosas da vida: doar sangue.

Pretendia doar sangue ontem (dia 28/08/2018), dia que a Igreja Católica Apostólica Romana dedica a Santo Agostinho (354-430). Mas desisti quando, logo ao acordar, percebi que estava o maior frio aqui pelos lados da Aclimação, onde vivo em São Paulo. O termómetro marcava 11 graus centígrados.

À noite, depois de voltar da Paróquia Santa Rita de Cássia de Vila Mariana, onde eu e Sueli fomos assistir à celebração da missa dedicada a Santo Agostinho, presidida pelo nosso pároco, Frei Cristiano Zeferino de Faria, tomei uma decisão: vou doar sangue amanhã (29) e com qualquer tempo. Esteja frio o quanto estiver.

E assim fiz. Levantei antes das 7h da manhã, vi que felizmente não estava tão frio, tomei todas as providências que deveria tomar e deixei minha casa logo em seguida.

Tinha duas alternativas: ir de Metrô (Ana Rosa-Clínicas) em direção ao Hemocentro do Hospital das Clínicas ou caminhando até o Hospital Dante Pazzanezze, nas proximidades do Parque do Ibirapuera.

Minha escolha foi o Dante, porque: 1) Fiz no HC a doação anterior, no dia 02/06/2018, poucos dias antes de viajar para os Estados Unidos; 2) O Metrô tem estado lotadérrimo nos horários de pico, ou seja, nas primeiras horas da manhã e no final da tarde e início da noite; 3) Ir até o Dante Pazzanese me daria a oportunidade de caminhar cerca de quatro mil metros, considerando a ida e a volta.

Foi o que fiz. Saí de casa e subi a Rua Dr. José de Queiroz Aranha (que ontem à noite tinha o último quarteirão, sentido Metrô Ana Rosa, na maior escuridão), atravessei o Largo Ana Rosa pelo nível da rua, entrei na Rua Conselheiro Rodrigues Alves e desci até a Avenida Dante Pazzanezze.

Fui feliz. E certo de que praticaria mais um ato de solidariedade aos meus semelhantes. Até porque “sangue é vida”, como me dizia o querido sogro José Arnaldo (1922-1999), herói da Segunda Guerra Mundial na batalha em que a FEB (Força Expedicionária Brasileira) tomou o Monte Castello, na Itália, em 21/02/1945.

Ao chegar ao Hemocentro do Dante fui o segundo a ser atendido. E logo fui chamado. Antes mesmo do rapaz que tinha sido o primeiro. Estranhei, mas fui em frente. E logo descobri a razão: a gentil senhora que me recebeu numa sala reservada me deu a má notícia, com gentileza, mas sem rodeios: “O senhor não pode doar”.

Meu mundo caiu. As lágrimas encheram os meus olhos. E eles assim ficaram mesmo depois das explicações da atendente: “O senhor já fez quatro doações neste ano. Essa seria a quinta. E a quinta só pode ser feita quatro meses depois da quarta. Volte, portanto, em outubro”.

Frustrado, abaixei a cabeça e deixei a sala. Saí e imediatamente desabafei no grupo da Família Amaral no WatsApp. A primeira reação foi imediata: Beatriz, minha netinha, que estava se aprontando para ir à escola, em Ashburn Village, na Costa Leste dos EUA, perguntou, assustada: “O que foi, Vovô?”

Mesmo depois das minhas explicações, por escrito, ela me ligou e tentou me consolar, de viva voz. Eu a atendi, ainda no lado externo do Hemocentro do Dante, e ouvi aquela jovem de apenas 11 anos me fazer uma proposta tentadora: “Vem doar aqui, Vovô”.

Beatriz é assim, há anos: faz de tudo para ter o Vovô e a Vovó Sueli junto deles, lá onde vivem desde 2011.

Por quê?

Ah... e você ainda pergunta por que, caro e-leitor?

(*) Cláudio Amaral (clamaral@uol.com.br) é autor dos livros Um lenço, um folheto e a roupa do corpo (2016) e Por quê? Crônicas de um questionador (2017). É jornalista desde 01/05/1968, Mestre em Jornalismo para Editores pelo IICS/SP (2003) e Biógrafo pela FMU/Faculdade de História/SP (2013/2015).

29/08/2018 13:32:52 (pelo horário de Brasília)

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