Por quê? (355) – Com ou sem planejamento?


Cláudio Amaral

Na busca de um caminho a seguir como escritor e consultor, devoro livros e mais livros.

O mais recente foi O nome de Deus é Misericórdia.

Trata-se de “uma conversa” que tiveram, em Roma, em julho de 2015, o Papa Francisco e Andrea Tornielli, “vaticanista, jornalista do La Stampa e responsável pelo site Vatican Insider”.

Em seguida – ou seja, exatamente nesta manhã fria da Costa Leste dos Estados Unidos, onde resolvi passar três semanas de férias, de 14/2 a 4/3/2016 –, peguei para reler um entre os nove livros que trouxe do Brasil.

E o escolhido foi um certo capitão rodrigo, escrito por Erico Verissimo, um dos mais destacados escritores que o Brasil já teve.

Nem parece que minha escolha foi aleatória. Foi como se tivesse escolhido de propósito. Afinal, nesta obra, Verissimo, o pai, faz uma série de referências ao modo de escrever um livro.

Logo na abertura o autor se e nos situa escrevendo:

- Estou na Rua dos Andradas, em Porto Alegre, no inverso de 1948.

A partir de então, Verissimo relata em detalhes a visita que ele fez a ele mesmo na Livraria do Globo. Eram dois personagens numa pessoa só: um representava o jovem autor de um certo capitão rodrigo em 1948; o outro, com 20 anos mais, tinha recebido dos editores a missão de produzir uma introdução para esta edição especial que estou relendo sob o frio estadunidense de 2016.

Exatamente no diálogo dos dois é que encontrei algumas dicas sobre como escrever uma obra, mesmo sabendo que jamais terei capacidade para gerar livros como os que Verissimo escreveu ao longo da vida:

- Todo escritor, dentro de certa medida, tem o direito de autoplagiar-se.

Com essa frase, na página 10, Verissimo passou a primeira experiência que eu busco – e que pretendo passar à frente, toda vez que for possível e solicitado.

Na página seguinte, ele detalhou mais, logo após o relato do escritor de 1948, a quem perguntara como ele, 20 anos antes, conseguia escrever em meio a cheiros de frituras que vinham dum restaurante ao lado:

- Ora, você conhece o truque. A gente foge para a paisagem da estória que está imaginando e lá se esconde, entre as personagens.

Em seguida, ele (o de 1948) pergunta a ele mesmo (o de 1970):

- Sabe onde estava eu quando você entrou? Nos campos que circundam Santa Fé, onde agora é primavera. Sentia na cara uma brisa perfumada de flores e ervas.

No final da página 13 e início da 14, outra lição importante:

- Você sabe que para principiar um livro necessito primeiro dum plano, cuja finalidade se parece com a dos projetos para uma construção arquitetônica.

Mas, na minha santa ignorância, imaginava exatamente o contrário, ou seja, que melhor seria escrever sem plano algum. E agora? O que faço se não tenho plano?

Verissimo, que já não sei se é o de 1948 ou o de 1970, é quem me tira dessa enroscada:

- E o livro será um desastre se você seguir rigorosamente esse plano...

E por que, então, precisarei de um plano, se não vou segui-lo, Sr. Erico Verissimo?

A resposta está numa outra frase da página 14:

- Necessitamos dum plano principalmente para desobedecer a ele.

Por quê?

Ah... e você ainda pergunta por que, caro e-leitor?

(*) Cláudio Amaral (clamaral@uol.com.br) é jornalista desde 1º de maio de 1968, Mestre em Jornalismo para Editores pelo IICS/SP (Turma de 2003) e Biógrafo pela FMU/Faculdade de História/SP (Turma de 2013/2015).

19/02/2016 17:39:28 (pelo horário de Inverno da Costa Leste dos EUA, onde estamos três horas antes do horário de Verão de Brasília) 

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