Por quê? (383) – A herança

Lázaro Alves do Amaral, o "Seu Lazinho", meu pai


Cláudio Amaral

“Meu pai não me deixou nada”, gritei para minha Amiga Lúcia Saraiva.

Foi na tarde de um dos sábados de Julho de 2001, em plena Rua Machado de Assis, aqui na Aclimação, “o bairro mais agradável de São Paulo".

Eu havia saído de casa e caminhava para o salão do Toninho Dainese, em busca de um bom corte nos meus cabelos.

Ao passar pela residência dos Saraiva dei de cara com o velho Amigo Irineu Saraiva e a filha, Lúcia.

Eles tiravam do carro as compras que tinham feito no supermercado.

“Gastando, veio?”, perguntei ao administrador do dízimo da nossa paróquia, a Santa Rita de Cássia de Vila Mariana, na Rua Dona Inácia Uchôa, 106, na zona sul de São Paulo.

É, gastando, porque quando eu morrer não vou levar nada mesmo e os filhos vão gastar tudo”, respondeu Irineu.

“Tá certo”, acrescentei.

“Tá certo, nada”, protestou Lúcia.

“Tá certo, sim”, retruquei.

“Eu também não vou deixar nada pros meus filhos. Vou torrar tudo em viagens”, disse, lembrando das maravilhas que vivi ao lado de Sueli em Lisboa, Madri e Barcelona, mês passado (Junho de 2001).

Disse isto e em seguida cometi a maior das injustiças para com meu pai, falecido em 1985, aos 65 anos. Foi quando gritei, porque já estava a cerca de 30 metros deles: “Meu pai não me deixou nada”.

“Deixou, sim, filho ingrato”, pensei imediatamente em seguida.

Foi aí que me veio à mente a ideia desse texto (escrito e publicado naquela época e recuperado hoje, 16/07/2019). Um texto com o qual faço justiça a meu pai, Lázaro Alves do Amaral.

Afinal, além de me colocar no mundo, com a parceria de Dona Wanda Guido do Amaral (1930-2010), ele me deixou uma herança impagável.

Dinheiro, é verdade, ‘Seu’ Lazinho não deixou nada pra ninguém. Deixou dois imóveis em Marília, onde morreu e foi sepultado. Imóveis que garantiram por anos a sobrevivência de minha mãe.

O mais importante, entretanto, foram os exemplos que ele nos deu ao longo dos 65 anos de vida; a mim, ao meu saudoso irmão Clówis Francisco do Amaral e às minhas irmãs Cleide e Clélia: o gosto pelo trabalho, que felizmente consegui passar para os meus três filhos, Cláudia, Mauro e Flávio; o respeito para com os nossos semelhantes; o apego à honestidade.

É esse tipo de herança que fiz questão de deixar tanto para os meus filhos e, a partir de 2007, para os meus netos Beatriz, Murilo e Mariana.

Valeu, ‘Seu’ Lazinho.

Por quê?

Ah... e você ainda pergunta por que, caro e-leitor?

(*) Cláudio Amaral (clamaral@uol.com.br) é autor dos livros Um lenço, um folheto e a roupa do corpo (2016) e Por quê? Crônicas de um questionador (2017). É Jornalista desde 01/05/1968, Mestre em Jornalismo para Editores pelo IICS/SP (2003) e Biógrafo pela FMU/Faculdade de História/SP (2013/2015).

16/07/2019 18:15:43 (pelo horário de Brasília)

Comentários

ana maria de lima de mello disse…
admirável.....parabéns...está em extinção pessoas providas de sentimentos bons...e continue a acrescentar na leitura para os que ainda nutre esperança de um mundo melhor...alimentando a alma dos carentes de um literatura saudável.....

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