Por quê? (386) – O menino fumante



Cláudio Amaral

No trajeto entre uma agência dos Correios, na Vila Mariana, e minha residência, na Aclimação, ambos bairros de São Paulo, Capital, dei de cara com mais uma cena deprimente do dia a dia paulistano.

Foi no Largo Ana Rosa, que deu nome a uma das mais movimentadas estações do nosso Metrô.

Numa manhã qualquer de Setembro deste 2019, o local estava mais lotado do que nunca de sem-teto e moradores de rua e lá presenciei uma cena inédita, para mim, pelo menos: um garoto de aproximadamente dez anos, como o meu netinho, pegando um resto de cigarro que estava no chão e dizendo para outro, maior que ele:

- Eu fumo com a minha boca...

E nada mais disse, mas, imagino, deve ter pensado:

- Cuide da sua vida, que eu cuido da minha... afinal, Deus deu uma vida para cada um e cada um que cuide da sua...

Pensei imediatamente em parar e falar com ele, mas senti que o ambiente não era propício. Os sem-teto eram muitos, entre crianças e adultos, homens e mulheres, e prejulguei que poderiam ser hostis para comigo.

Mas, se tivesse tido coragem para parar e falar com o menino, penso que teria dito algo assim:

- Bom dia, jovem... eu sou Cláudio Amaral e você?

Com isso esperava que ele me dissesse o respectivo nome e então eu diria:

- Tenho 70 anos...

- E perguntaria, de imediato:

- Que idade você tem?

Assim que ele me respondesse, e dissesse a idade dele, se é que iria dizer, acrescentaria:

- Se você tem vontade, fume, mas antes pense nos problemas de saúde que o fumo e as substâncias nele contidas causarão em você...

Falaria a ele, por exemplo, de males como o enfisema pulmonar (https://www.tuasaude.com/sintomas-de-enfisema-pulmonar/) e as consequências dessa doença respiratória na qual os pulmões perdem a elasticidade devido à exposição constante a poluente, e principalmente ao tabaco, resultando na destruição dos alvéolos, as estruturas responsáveis pela troca de oxigênio.

Entretanto, como nada disso aconteceu, voltei para casa, triste e cabisbaixo, e fiquei a pensar no futuro que poderá ter uma criança que vive nas ruas de uma metrópole como São Paulo.

Uma criança que certamente não tem quem dela cuide, a oriente, a encaminhe para os estudos e os bons costumes, a proteja dos homens sem boas intenções e a indique os bons caminhos e atitudes. E mais: que mostre os sintomas mais comuns do enfisema pulmonar, que costumam surgir após os 50 anos de idade: sensação de falta de ar, chiado no peito, tosse persistente, dor ou sensação de aperto no peito, dedos das mãos e pés azulados, cansaço, aumento da produção de muco (ou ranho), inchaço do tórax e do peito, maior susceptibilidade à infecções pulmonares. E que daí para a morte é um passo curto.

Por quê?

Ah... e você ainda pergunta por que, caro e-leitor?

(*) Cláudio Amaral (clamaral@uol.com.br) é autor dos livros Um lenço, um folheto e a roupa do corpo (2016) e Por quê? Crônicas de um questionador (2017). É Jornalista desde 01/05/1968, Mestre em Jornalismo para Editores pelo IICS/SP (2003) e Biógrafo pela FMU/Faculdade de História/SP (2013/2015). É também voluntário da Pastoral da Comunicação Social da Paróquia Santa Rita de Cássia de Vila Mariana.

29/09/2019 14:19:56 (pelo horário de Brasília)



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