Por quê? (415) – No tempo dos bondes elétricos

Os bondes elétricos circularam pelas vias paulistanas até 1968

Cláudio Amaral

Na minha primeira passagem por São Paulo, Capital, nos anos 1950, a cidade era bem diferente. Tinha poucos arranha-céus, trânsito tranquilo, gente sem estresse e o número de veículos era bem menor nas nossas estreitas vias públicas. O sistema metroviário só era conhecido de perto por quem viajava, por exemplo, para Nova Iorque ou alguma cidade grande da Europa.

Aqueles que seguem essas minhas crônicas sabem que nasci em Adamantina, no Interior paulista. Já leu também qu’eu vim de lá, via Marília, quando ainda tinha cinco anos. E conhece o motivo da mudança de minha família: meu pai buscava cura para a paralisia infantil de meu irmão Clóvis, pois na época ainda não existia a vacina descoberta pelo Cientista Albert Sabin (Albert Sabin – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org), que só chegaria ao Brasil nos anos 1960.

Vivemos aqui até logo depois da Copa do Mundo de 1958, a primeira ganha pela seleção brasileira dirigida pelo Treinador Vicente Ítalo Feóla. Um selecionado que tinha muitas estrelas, entre elas o jovem Pelé, de apenas 18 anos. E cuja delegação era comandada pelo empresário Paulo Machado de Carvalho, dono da Rede Record de Rádio e Televisão e que depois veio a ser conhecido como o Marechal da Vitória.

O transporte público naqueles anos era dominado pelos bondes elétricos, que surgiram no início dos anos 1900 com a chegada ao Brasil da companhia canadense Light [(Light S/A – Wikipédia, a enciclopédia livre (wikipedia.org)], como nos mostra os arquivos do site Bondes de São Paulo -- Trens de passageiros do Brasil (estacoesferroviarias.com.br). Eles rodaram pelas ruas paulistanas até Março de 1968 e a última viagem aconteceu na linha Santo Amaro.

Usei os tais bondes elétricos por inúmeras vezes. E estive sempre acompanhado do meu saudoso pai, Lázaro Alves do Amaral (1920-1985), cujo corpo foi sepultado no Cemitério Municipal de Marília, o chamado Cemitério da Saudade.

Lembro-me bem que meu querido Tio Walter Guido também ia trabalhar sempre de bonde. Ele era funcionário das oficinas do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. E os bondes elétricos representavam o melhor meio de transporte para ele, entre a residência, no Sacomã, e o trabalho, nos altos de Cerqueira César.

Mas não me recordo de ter feito uma única viagem com meu tio. Mas com meu pai, sim. E uma delas está viva na minha memória até hoje. Foi um fato marcante para o menino que usava calças curtas e não tinha mais do que sete anos. Estávamos dentro dum bonde aberto, tipo jardineira, que não tinha proteção nas laterais. Os passageiros podiam, então, subir e descer com o veículo em movimento. Bastava ter condições físicas e agilidade. E como estava sentado no primeiro lugar de um dos bancos, meu pai teve o chapéu arrancado por uma corrente de vento. Ele usava chapéu todo dia e, ágil como pouco, desceu do bonde e saiu correndo em busca do precioso companheiro de tantas jornadas. Fiquei assustado. Pensei logo em como voltaria para casa sem o pai. Cheguei a pensar em pedir para o motorneiro que estava a conduzir o elétrico para parar e esperar o seu Lazinho. Mas ele, o meu pai, foi mais rápido e logo voltou a sentar ao meu lado, como se nada tivesse acontecido.

Aquela foi uma experiência tão marcante e inesquecível que até hoje me vejo vivendo tal aventura. Em especial quando um Amigo como o Engenheiro Feres Kairalla me manda mensagem perguntando se conheci e ou utilizei os bondes elétricos de São Paulo.

Por quê?

Ah... e você ainda pergunta por que, caro e-leitor?

(*) Cláudio Amaral (clamaral@uol.com.bré Católico Apostólico Romano, Corinthiano e devoto de Santo Agostinho e Santa Rita de Cássia. É autor dos livros Um lenço, um folheto e a roupa do corpo (2016) Por quê? Crônicas de um questionador (2017). É Jornalista desde 01/05/1968, Mestre em Jornalismo para Editores pelo IICS/SP (2003) e Biógrafo pela FMU/Faculdade de História/SP (2013/2015).

12/07/2021 23:37:25 (pelo horário de Brasília)

Comentários

Geraldo Nunes disse…
Gostei da referência que fez ao surgimento da vacina Sabin que só chegou ao Brasil na década de 1960. Eu nasci em 1958 e adquiri a poliomielite em 1959,antes da Sabin.

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