Por quê? (286) F-Indy: experiência única


Cláudio Amaral (ao lado de Bia Figueiredo, no Anhembi, 6ª-feira)

A vontade de sentir a emoção de ver o carro correr a 200, 250 ou 300 quilômetros por hora foi grande. Foi. Passou logo após os meus 30 ou 40 anos de idade. Hoje é passado. Ainda que meu filho caçula não consiga entender esse meu estado de espírito.

Flávio, meu caçula, que já passou dos 30, é fanático por velocidade. Assiste a todas as provas da Fórmula 1 e sempre que pode – ou seja, quase todo dia – pratica no simulador que instalou no computador.

Ele garante que conhece cada curva de todos os circuitos da Fórmula 1 e analisa com propriedade todas as corridas disputadas no Brasil, na Ásia, na Europa e na América do Norte.

Há duas semanas começou a insistir comigo que deveríamos comprar ingressos para ver a Fórmula Indy no Parque do Anhembi, aqui em São Paulo. Mas, como eu não me entusiasmei, ele ficou desolado.

Só se animou quando escrevi uma frase de incentivo à piloto Bia Figueiredo a convite da rede de postos Ipiranga, que patrocina a única brasileira que disputa a Fórmula Indy.

Escrevi com o coração, porque acompanho a carreira de Bia desde quando ela corria no Kartódromo Schincariol, em Itu, a cerca de 100 quilômetros da Capital. Naquela época, final dos anos 1990, eu trabalhava para a cervejaria ituana e vi a pequena Ana Beatriz Figueiredo deitar e rolar em cima de pilotos como Nelson Ângelo Piquet, filho do grande e famoso Nelson Piquet.

Assim que a Ipiranga me comunicou que eu havia ganhado o direito de ir ao Anhembi nestes três dias de Fórmula Indy (27, 28 e 29 de maio de 2012) e dar uma “volta rápida” num carro de corrida, mandei cópia da mensagem para Flávio. Ele vibrou e ao mesmo tempo me pediu para ir junto. Foi comigo até o hotel indicado pela organização, aqui perto, no Paraíso, cavou uma vaga na van que nos levou ao Anhembi, circulou por todos os boxes, fotografou carros e pilotos. E fez mais: cavou o direito de também dar a tal da “volta rápida”. E gostou. Só não gostou mais porque foi uma volta, apenas. Ele queria mais. Muito mais.

Finalmente chegou a minha vez. E eu, que já estava nervoso, tremi como um condenado a caminho da forca. Sequer conseguia vestir o macacão e precisei de ajuda para colocar o capacete. Para entrar no cock-pit, então, foi o maior sufoco. Precisei da ajuda de dois homens enormes, que só falavam inglês e, uma vez acomodado, me senti como sardinha em lata.

Meu relógio marcava aproximadamente 15 horas quando o motor foi acionado mediante partida elétrica externa e a “volta rápida” demorou uma eternidade, ainda que o carro rodasse a milhão.

Fui obrigado a fazer exercícios especiais de respiração para não colocar o coração pela boca e nem quando o carro parou no mesmo local de onde havíamos partido eu me senti tranquilo. Pelo contrário. Fui retirado novamente à força pelos dois brutamontes estrangeiros e a única frase que consegui falar ao colocar os pés em terra firme foi: “Never more. Never more”.

Flávio e a plateia reunida pela equipe da Ipiranga não acreditavam no que viam em mim, mas eu tremia e tive que me isolar na barraca da organização, sentar e esperar a tremedeira passar.

Durante os 30 ou 40 minutos em que estive isolado, revi em detalhes e mentalmente as três curvas à direita e as três curvas à esquerda, sempre raspando os muros do Anhembi em altíssima velocidade. E o que foi pior: sem ver nada à frente, porque era impedido pela presença do piloto, que nem o nome consegui saber. Nem o nome do piloto, nem a velocidade precisa que o carro alcançou. Só sei – ou melhor, imagino – que fomos a mais de 200 por hora.

Ao contrário de mim, meu filho queria mais. Muito mais. Ele e todos os demais convidados do patrocinador de Bia Figueiredo. Nem quando chegamos de volta ao hotel, no Paraíso, ele se conteve. Tanto que dormiu pouco de sexta-feira para sábado, levantou cedo, tomou banho, engoliu o café da manhã e saiu novamente para o Anhembi.

Ele só ficou parado diante da beleza e da simpatia de Bia Figueiredo. A pequena menina dos anos 1990, que hoje é uma mulher feita, e bem feita. Inteligente e bem educada, pronta para fazer sucesso entre todos os pilotos da Fórmula Indy.

Tivesse eu a oportunidade de sentir a emoção da alta velocidade numa das centenas de corridas que acompanhei de perto por mais de 20 anos em autódromos e kartódromos do Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, minha reação teria sido outra. Bem diferente da que senti na sexta-feira, no Anhembi.

Por quê?

Ah... e você ainda pergunta por que, caro e-leitor?

(*) Cláudio Amaral clamaral@uol.com.br é jornalista desde 1º de maio de 1968.


28/4/2012 21:42:33

Comentários

Cláudio Amaral disse…
CavalcantiLito Lito Cavalcanti

Muito boa sua crônica, meu amigo.

Parabéns.

RT @amaralclaudio: Sua primeira vez foi assim, Amigo @CavalcantiLito?

Postagens mais visitadas deste blog

Por quê? (111) Rumo a Adamantina

Por quê? (440) – A 15ª vez, uma das melhores viagens

Por quê? (439) – Os 101 anos de José Padilla Bravos