Por quê? (184) Uma vírgula, por favor


Cláudio Amaral

Desconheço o dia – ou melhor, o momento – em que fui apresentado à vírgula.

Imagino ter sido logo após minha apresentação às palavras e vice-versa.

Teria sido, então, no máximo aos 5 anos de idade, porque eu sou amigo das letras desde bem pequeno.

Das letras, maiúsculas e minúsculas, e, por consequência, dos pontos, das vírgulas, dos hífens, dos travessões, dos parágrafos.

Dos lápis e das canetas, também.

Até com caneta tinteiro eu convivi.

Lembro-me bem dos tinteiros da marca Parker, por exemplo.

E quem é que não se lembra?

Talvez, só aqueles que ainda não chegaram aos 50 anos de idade.

Bem, mas o assunto, hoje, é a vírgula.

A vírgula que é um sinal gráfico dos mais discutidos, debatidos, analisados e... combatidos – porque não.

Li um livro, certa vez, que não tinha uma única vírgula e no qual, no fim, o autor colocou centenas delas e recomendou que cada um fizesse o uso que preferisse.

Hoje, exatamente nesta sexta-feira, 18 de setembro de 2009, encontrei algo parecido.

Lendo O Leitor Apaixonado – Prazeres à luz do abajur, escrito por Ruy Castro, organizado por Heloisa Seixas e editado pela Companhia Das Letras, me deparei com a seguinte frase:

- Não descansarei enquanto não sepultar a última vírgula do mundo.

Está na página 197, em meio ao texto intitulado Gertrude Stein – O búfalo da Rive Gauche.

Ruy Castro se refere a uma escritora que, segundo ele, agitou Paris de 1903 a 1939.

Mais do que uma escritora, Gertrude Stein é apresentada no referido texto como uma agitadora cultural.

Ela teria descoberto e apresentado ao mundo gente como Picasso, Matisse, Cézanne, entre muitos outros que a visitavam no sobrado de número 27 da rue de Fleurus, em Paris.

Mas, esses são detalhes que você deverá procurar no livro de Ruy Castro que estou a ler nestas manhãs de inverno, no aconchegante apartamento que divido com Sueli, no bairro da Aparecida, junto ao Canal 6, em Santos.

No apartamento, nas praias santistas, nas salas de espera, nas filas de bancos e, porque não, nos ônibus da Viação Piracicabana que me levam daqui para o Centro Histórico, quase todos os dias, ora o circular 004, ora o 019 (aquele que passar primeiro pelo ponto em que eu me coloco no rumo do bairro para a cidade).

O que importa, nesta crônica, é a vírgula.

A vírgula que, segundo Ruy Castro, incomodava Gertrudes Stein a ponto dele, Ruy, observar:

- Gertrudes parecia ter algo pessoal contra vírgulas.

Observar e acrescentar:

- Seu romance de mil páginas, The making of Americans, não tinha uma única vírgula, nem para remédio.

Diante do argumento de que “as vírgulas eram importantes como pausas, para permitir ao leitor respirar”, Gertrudes “não se convenceu”, segundo Ruy Castro e disparou:

- Quem tem de saber quando respirar é o leitor.

Por quê?

Ah... e você ainda pergunta por que, caro e-leitor?

(*) Cláudio Amaral clamaral@uol.com.br é jornalista desde 1º de maio de 1968, repórter, editor, professor e orientador de jovens jornalistas, palestrante e consultor de empresas para assuntos de comunicação empresarial e institucional.

18/9/2009 11:29:48

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