Por quê? (23) Figura


Cláudio Amaral

Uma figura no mínimo inusitada circula pelas ruas, lojas, centros comerciais, ônibus, estações e trens do Metrô de São Paulo.

Na manhã de hoje, quarta-feira, dia 9 de janeiro de 2008, ela, a figura, circulou entre a região central e a zona sul da Capital paulista.

Saiu não se sabe de onde e entrou no Metrô pela estação Sé.

Passou pela roleta, disse “bom dia” aos funcionários que cuidavam da segurança e ficou pelo menos 30 minutos na plataforma.

A circulação de trens estava anormal, “lenta”, segundo os operadores da linha norte-sul.

Paciente, ela, a figura, de nada reclamou.

Estava atrasada para entrar em serviço, mas se limitou a olhar uma vez, apenas uma, para o relógio: 10h15.

Depois de conferir a hora no Bulova prateado que levava ao pulso, ela, a figura, olhou para uma senhora impaciente ao seu lado direito e balbuciou, entre dentes:

- Eu deveria estar no trabalho há pelo menos 75 minutos.

Nem por isso se apressou a entrar no trem.

Entrou quando foi possível, se apertou entre os demais passageiros e logo conseguiu um lugar para se sentar.

Evitou sentar no primeiro lugar que vagou pelo simples fato de que ali ela, a figura, viajaria de costas.

Assim que vagou um lugar que a permitisse ir para frente, no sentido Jabaquara, ela, a figura, se apressou.

Antes, entretanto, perguntou a duas jovens que estavam mais perto do banco vago:

- Posso me sentar aqui?

Como ambas disseram “sim”, a figura se acomodou, sorriu para o passageiro do lado direito e se manifestou:

- Bom dia.

Uma senhora se sentou na frente, no banco seguinte, e também ganhou uma saudação:

- Bom dia.

Nem o passageiro da direita, nem a mulher do banco da frente responderam.

Ainda assim, ela, a figura, sorriu para ambos.

Sorriu e falou com os dois.

Repetiu o “bom dia” quando o passageiro do lado direito se levantou para desembarcar na estação Vila Mariana e para a mulher do banco da frente quando ela, a figura, se dirigiu à plataforma da estação São Judas.

Para espanto geral, a figura no mínimo inusitada disse um “bom dia” geral para as pessoas que esperavam ônibus em frente à Escola Estadual de Primeiro Grau Almirante Barroso, na Avenida Jabaquara, sentido Aeroporto de Congonhas, logo após as igrejas de São Judas Tadeu.

“Bom dia” ela, a figura, desejou também ao motorista e ao cobrador do ônibus 62.518, que trafegava em direção ao “Aeroporto, via Aratãs”.

No ônibus, cumprimentou também duas jovens vestidas ao estilo das aeromoças, uma moreninha e uma branquinha, que levava aliança num dedo da mão direita.

Teve vontade, mas faltou-lhe coragem para perguntar se a moça estava noivando ou namorando.

Mas teve coragem suficiente para dar um aviso a ela:

- Sua bolsa está aberta.

Ganhou um sorriso e um “muito obrigada”.

Foi o suficiente para ela, a figura, pensar “ganhei o dia” e descer feliz no segundo ponto após o aeroporto, junto a um hiper-mercado.

Por quê?

Ah... e você ainda pergunta por que?

(*) Cláudio Amaral clamaral@uol.com.br é jornalista desde 1º de maio de 1968; professor e orientador de jovens jornalistas; palestrante e consultor de empresas para assuntos de comunicação institucional.

9/1/2008 11:34:12

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