Por quê? (31) O vidro
Cláudio Amaral
A figura no mínimo inusitada a que me referi na crônica do dia 9/1/2008 foi vista novamente na manhã deste sábado, 26/1/2008.
Primeiro, na Avenida Altino Arantes, quase esquina com a Rua Domingos de Moraes, na Vila Clementino, zona sul da Capital paulista.
Depois, na Rua Mário Amaral, no Paraíso.
De carro – sim, desta vez ela, a figura, estava motorizada –, chegou antes das 9 horas junto ao Colégio Nossa Senhora do Rosário, na Altino Arantes.
Chegou e estacionou na diagonal um Fit Honda com pouco mais de 2.000 quilômetros rodados.
Cinza, bonito, ainda que meio sujo, o automóvel chamou a atenção de uma mulher de olhos puxados.
“Seu carro está novo”, disse ela, a oriental.
“Quem me dera ter um carro assim”, respondeu a figura.
A mulher recolheu o sorriso e foi em frente.
Certamente, pensara: “Se não é seu, de quem é? Você o roubou? De quem? Onde?”
Se pensou, não falou.
Não falou por precaução? Por medo? Por timidez?
Quem sabe.
O certo é que a figura no mínimo inusitada nada percebeu e 40 minutos depois foi embora no Fit.
Subiu a Altino Arantes, entrou à esquerda na Domingos de Moraes, na continuação rodou a Rua (ex-estrada do senador) Vergueiro, passou sobre o Viaduto Santa Generosa, fez a volta logo após o Shopping Paulista e desceu a Rafael de Barros até a Mário Amaral.
Depois de entrar à esquerda na Mário Amaral, estacionou em frente ao prédio em construção no número 432.
Lá, procurou o vigia e pediu para ver o apê à venda.
“É o 21”, disse o rapaz, de nome José Ailton.
“Pode subir e ver”, acrescentou uma figura de baixa estatura, chinelo de dedos, calça curta e camiseta de quem não se assusta mais com o frio de São Paulo, embora tenha vindo lá de cima, ou seja, dum daqueles estados quentes do norte ou do nordeste.
Apartamento visto, a figura no mínimo inusitada desceu, pisou a calçada novamente e lá ficou, como se estivesse a esperar alguém.
Nisso, dois homens, pai e filho, saíram do prédio da frente carregando um vidro de dois metros de comprimento por um metro de largura.
Iriam levar o objeto transparente para o interior de uma Kobim branca, de placas CIV 4828.
Mas, com as quatro mãos ocupadas com o vidro, grande e pesado, eles não conseguiam abrir a porta do veículo.
Ai a figura não teve dúvida: entrou logo em ação e, como gosta de fazer sempre, se ofereceu para ajudar.
Pai e filho sorriram, aceitaram a ajuda e depois o velho, que não é tão velho assim, disse “obrigado” e acrescentou: “Deus lhe pague”.
Educada, católica praticante e temente a Deus, a figura devolveu o sorriso e respondeu: “Amem”.
Isto posto, virou sobre os sapatos comprados em Franca (SP), entrou no Fit e foi embora, feliz da vida.
Havia ganhado o dia.
Por quê?
Ah... e você ainda pergunta por que?
(*) Cláudio Amaral clamaral@uol.com.br é jornalista desde 1º de maio de 1968; professor e orientador de jovens jornalistas; palestrante e consultor de empresas para assuntos de comunicação institucional.
26/1/2008 14:43:43
Comentários